Isis Fleck dos Santos
Integrante do “Vem Pra Vida”, farmacêutica, membro da Igreja Batista na Brasília, em Altamira – PA
“Depressão é falta de Deus!”, “Cristão não deve tomar medicamento controlado!”. Essas e tantas outras frases são comumente faladas entre as Igrejas nos dias de hoje. Mas será que isso traz algum benefício para alguém que tanto necessita de ajuda?
No meio dos cristãos, especialmente entre jovens, é comum encontrar resistência ao uso de medicamentos psiquiátricos. Muitos ainda acreditam que esses medicamentos são desnecessários ou até mesmo errados, associando a depressão e a ansiedade à falta de fé ou a uma espiritualidade insuficiente e rasa. No mês de setembro, nós do Vem Pra Vida estamos trabalhando o tema “De coração sincero” e, com esse texto, queremos oferecer uma perspectiva equilibrada sobre esse tema, desmistificar pensamentos equivocados e encorajar uma abordagem mais compassiva, empática e informada.
Primeiramente, é válido lembrar que a saúde mental é um assunto delicado e complexo da vida humana. Quando surgem transtornos, doenças, ou desequilíbrios, o tratamento deve ser amplo e adaptado às necessidades individuais. Médicos e psicólogos são usados por Deus para exercer suas profissões e cuidar de vidas, e isso não deveria ser um tabu no mundo cristão.
Elisabeth Elliot, autora de vários livros e referência para muitas jovens cristãs, escreveu em seu livro “Deus é Suficiente” sobre como a fé e a medicina podem coexistir: “A medicina moderna, incluindo o uso de antidepressivos e ansiolíticos, pode ser um presente de Deus para ajudar a lidar com as dificuldades emocionais. A fé não exclui o uso desses tratamentos; pelo contrário, pode nos ajudar a usá-los com sabedoria, reconhecendo que Deus pode trabalhar através deles para nosso bem-estar”.
O cristão não está isento de passar por dores e sofrimentos. A Bíblia é bem clara ao dizer que no mundo teríamos aflições, mas também nos diz que devemos ter bom ânimo, pois Ele estaria conosco. Além disso, nos ensina que devemos nos gloriar nas aflições, pois elas produzem perseverança, caráter aprovado e esperança (João 16.33; Romanos 5.3-5).
Ao olharmos para a Bíblia, vemos que ela é rica em histórias de personagens que enfrentaram grandes dificuldades. Muitos homens e mulheres de Deus se viram em momentos de aflição, como Elias, Jó, Jeremias, Davi, e alguns deles até desejaram a morte. Isso demonstra que, mesmo aqueles que têm uma profunda relação com Deus, não estão isentos de enfrentar dores e ansiedades, o que nos faz enxergar com mais empatia.
Buscar ajuda e orientação de Deus nos encoraja à sabedoria e ao cuidado com o corpo e a mente, e isso é bíblico. Buscar ajuda médica ou psicológica não anula a suficiência das Escrituras e do poder de Deus para curar, mas é uma forma de buscar apoio de pessoas capacitadas para ajudar a enfrentar tais dificuldades.
O preconceito pode fazer com que jovens que lutam com isso se sintam envergonhados ou relutantes em buscar ajuda. Nós, como Igreja local, devemos ser um canal de bênção e ser o local onde essas pessoas possam se sentir livres para compartilhar suas dificuldades sem medo. Para combater isso, é essencial promover uma compreensão mais profunda e empática sobre essas condições. Devemos praticar o acolhimento, o apoio e incentivar as pessoas a buscar ajuda médica e psicológica, sem negligenciar as práticas espirituais.
Temos que entender também que, muitas vezes, é em meio à dor e ao sofrimento que enxergamos o quanto carecemos de Deus, o quanto precisamos de Sua Graça e misericórdia, e que Deus é suficiente, nos apegando fielmente às Escrituras, como C.S. Lewis diz em seu livro “A Dor e o Sofrimento”: “A dor e a ansiedade são um grito de alerta, não um grito de desespero. Eles são um convite para nos aproximarmos de Deus, que é nosso refúgio em tempos de necessidade. A dor pode nos levar a uma experiência mais profunda de Deus e a um entendimento mais claro de Sua soberania”.
Por último, lembre-se: “Só ele cura os de coração quebrantado e enfaixa as suas feridas. Ele determina o número de estrelas e chama cada uma pelo nome. Grande é o nosso Senhor e tremendo é o seu poder; é impossível medir o seu entendimento” (Salmos 147.3-5).